Saturday, August 24, 2013

Lendas do Laerte X
Reza a Lenda que fomos pescar no rio Jordão, pela estrada de terra. O truco já estava marcado para a noite daquele sábado de abril de 1971. Fomos 6 pescadores no fusca do meu pai. Lá encontramos um amigo que tinha uma lavoura de milho e nos deu várias melancias. Adoramos os imensos presentes. Pescamos até as 17:00h e não tolerando mais os borrachudos, decidimos voltar com os lambaris já pescados. Eram só 11 km, mas demorava 20 minutos por causa de buracos, porteiras e colchetes, que são aquelas cercas móveis que se engancham em duas voltas de arame. Num daqueles buracos o carro quebrou e a roda caiu. Não tinha saída. A gente tinha que ir a pé e providenciar reboque. Começamos a andar, cada um com sua melancia no ombro. Já escurecendo, outro fusca, cheio de gente, passou em direção à ponte. Ele parou e uma ex-namorada do Laerte, que lhe provocava arrepios, desceu e começou a conversar com ele e nós continuamos andando. O Laerte tinha apanhado uma flor, como a da foto, para dar à namorada na cidade, mas na presença da ex, deu a ela e marcou um encontro. Uns 300 metros à frente, ninguém aguentava mais carregar as enormes melancias. Perto de um colchete meu pai viu uma baita jaracuçu. Com um pau executei a peçonhenta e ia jogá-la fora, quando me ocorreu um plano: - Sacanear o Laerte que vinha lá atrás. Tirei uma longa linha quase invisível do bornal, amarrei na cabeça da cobra morta e a outra ponta, amarrei no pau que usara para matá-la. Enrolei a cobra e a coloquei onde ele tinha que passar, deixando o pau ao alcance. Ficamos escondidos para ver a cena. Daí a pouco ele chegou. Ao abrir o colchete ele pisou na cobra, saltou por cima gritando e já catou o pau. Assim que o levantou a cobra veio junto. Ele pulava para trás e gritava “acode”, levantava o pau e a cobra amarrada acompanhava e quanto mais ele gritava, mais a gente ria. Quando desconfiou do trote, já estava sentado no chão com a cobra sobre as pernas. Tinha gente que chorava de rir. Ele passou emburrado sem dizer nada. Andou uns 10 metros e voltou. Foi procurar sua melancia que tinha caído e se arrebentado no chão. Novamente passou por nós e dessa vez ele disse: “Não estou com raiva não, mas pelo menos a melancia vocês me devem”. Cada um, rapidamente, colocou sua melancia na frente dele e continuamos nosso caminho. Ele pegou a maior e veio junto. Andou uns 200 metros, colocou a melancia no chão e disse: “Não dá mais não, amanhã venho buscar.” Chegamos em casa, jogamos o truco, comemos lambaris fritos, com cerveja gelada, rimos muito da aventura e comemos a galinhada que a tia Fia cozinhou. Já eram 5:00h da manhã e fomos, de caminhão, buscar o fusca. As melancias e a roda quebrada já não estavam mais lá.

Monday, August 19, 2013


Reza a Lenda que nos anos 1968 havia uma turma de jogadores de truco e a reunião era aos sábados à noite, lá na Olegário Maciel, para trucar e de madrugada, saborear uma galinhada caipira com uma cachacinha e cervejas.   Para isso tínhamos um acordo de que a cada sábado um do grupo trouxesse a galinha.   Uma colega minha de sala disse que o pai dela tinha muitas galinhas e que elas dormiam perto do muro no qual havia um buraco e que elas ficavam ao alcance da mão. A irmã dela estava perto e confirmou. Como era a minha vez de fornecer a penosa, combinei com o Laerte de irmos no carro dele. Naquela noite tinha mais truqueiros do que de costume e resolvemos levar 2 galinhas. Acontece que a minha colega e a irmã tinham discutido e a irmã contou ao pai sobre as galinhas.  O velho bigodudo de cara muito ruim ficou de tocaia perto do buraco, com um porrete. Chegamos lá, rua Dr. Alberto Moreira, às duas da manhã, a casa era em frente ao armazém Estrela, hoje armazém Feliz e lá estava o buraco.  Tudo silencioso. Ajoelhei no chão, o Laerte estava do lado, introduzi o braço até o ombro, de repente,  tomei uma cacetada na mão que tremeu o braço todo. Puxei logo o braço para trás, cobri a mão com casaco e disse ao Laerte, “a minha já peguei, rápido pega a sua, pra gente ir embora.” Ele ficou uma semana sem falar comigo.

Reza a lenda que em Araguari aos domingos as famílias reunidas no almoço se deliciavam com um franguinho caipira. Quem se lembra dessa época?
REZA A LENDA QUE EM ARAGUARI ... A MARIA FUMAÇA funcionava com uma caldeira longa e robusta com ¾ de água e uma fornalha a lenha ou carvão, alimentada pelo foguista, que aquecia a água a mais de 100 graus, produzindo vapor, movendo enormes pistões que, em vai e vem, faziam girar as rodas de ferro sobre os trilhos. A certa distância percorrida parava e reabastecia de lenha e água em locais prepar...ados para tal fim. O foguista, coberto de fuligem e o maquinista, de boné, conduziam a composição (locomotiva e vagões), O Chefe de Trem usava uniforme impecável. Ironicamente o depósito de lenha e carvão, anexo à locomotiva, chamava-se “TENDER” (Carinhoso em Inglês), ser foguista era lenha. No final dos anos 1950 chegaram as locomotivas a diesel e as Maria fumaças passaram só a manobrar vagões. Em 1958/59 ao viajarmos de trem de ferro, o ritual era o mesmo: Chamar o Sr. Civi ou o Sr. José Telha, do ponto Chic de táxis e descarregar as malas na plataforma da Estação Goiás. No guichê, tinha uma janelinha que abria como guilhotina e o vendedor entregava a passagem, um cartãozinho verde que seria perfurado pelo cobrador. O trem de passageiros dava um apito, um arranco e se punha a percorrer toda a extensão da Av. Btl Mauá, onde eram os trilhos, passando pelo Desamparo e só parava lá em Stevenson. Uns passageiros desciam outros subiam. Lá vendiam coxinhas, quibes e café quente. Abasteciam o reservatório da caldeira com água e prosseguiam até a Estação Jiló, embarque e desembarque. Se houve passageiro, parava em Sobradinho. O grande viaduto só seria construído nos anos 70. Quando a composição fazia curvas, corriam para fechar as janelinhas de vidro para impedir que minúsculas brasas que saiam junto com a fumaça pela chaminé, entrassem e fizessem pequeninos buracos nas camisas dos passageiros. Os bancos dos vagões de primeira eram estofados, os de segunda eram de madeira. A viagem era de mais ou menos 3 horas do embarque ao desembarque. O Vagão Restaurante era o paraíso. Nos anos 70 algumas variáveis contribuíram para acabar com o sonho: o lobby dos pneus e caminhões, a privatização da RFFSA e o asfalto. O gado era transportado por carretas e as BRs foram totalmente asfaltadas. O Trem de Aço que fazia o percurso de São Paulo a Brasília passando por Araguari pontualmente à meia noite, foi perdendo seu encanto e eficiência. As estações Goiás e Mogiana foram desativadas, a Escola Profissional liderada pelo Sr. João Coimbra, que formou tantos torneiros e marceneiros foi fechada. Por um tempo ainda era possível tomar um trem de passageiros na nova estação e matar a saudade, depois também isso foi encerrado. Hoje temos déficit de transportes, temos a capacidade instalada e nada é ativado. Isso ainda me entristece.See more
— at MARIA FUMAÇA ESTACIONADA EM FRENTE AO HOSPITAL DOS FERROVIÁRIOS EM ARAGUARI-foto André Luiz Chaves.

BANDA MARCIAL DO COLÉGIO ESTADUAL DE ARAGUARI - Desfilando em 7 de setembro de 1969, chegando ao palanque armado na praça Getúlio Vargas onde estavam os Diretores dos colégios, o Vigário, o Gerente do BB, o Prefeito, o Coronel do 2º Btl e outras autoridades. Os primeiros são os fuzileiros. Dos que me lembro: Silvinho da farmácia, Valter Mamede Filho, Luiz Antonio Oliveira Salomao, Andre Luiz Chaves (eu), Hamilton Tadeu (de óculos, futuro Delegado de ...Araguari), Eurípedes Ezequiel. No tarol está o Claret no centro. Acher no clarim, o Bruno no piston e o Anderson Mamede na corneta. A Banda Marcial era composta por 131 instrumentos. Na vépera do desfile, nós nos reuníamos no Colégio para preparar todos os instrumentos, polindo, pintando e estampando os couros dos fuzileiros com motivos pertinentes. Notem na foto, que na época ainda havia muitos veículos de tração animal e era necessário desviar dos "presentes" deixados na rua
LAMBARI DA REGIÃO
Reza a Lenda que em Araguari,
Quatro ruas se interceptam em dois flamboyants, Olegário Maciel, Bias Fortes, Brasil Acciolly e Aquileu Nogueira, perto do Edifício dos Bancários. Nos idos de 1997, abriu ali, na Aquileu Nogueira, um simpático barzinho chamado Bar do Damião, onde é hoje o Tabelionato de Protestos. Tinha uma cerveja geladíssima e tira-gostos tipicamente regionais que acrescentavam gosto. Num sábado daquele ano, fomos ainda de madrugada, pegar uns peixinhos sob a ponte Wagner Estelita Campos, na divisa de Araguari com Catalão. Votamos com a capanga vazia. Demandados pela sede, ali pelo meio dia, chegamos lá no novo barzinho, meu irmão Herlon, Vinícius Mayer, meu sobrinho e eu, ansiando por uma gelada . Lá pela quarta cerveja, a senhora que nos atendia, trouxe uma farta travessa de lambaris fritos, declarando-os como cortesia da casa. O Vinícius solicitamente perguntou: “O lambari é da Região?” e ela: “É, o meu marido é o Damião.”
Reza a Lenda que a rua Olegário Maciel na altura do nº 607 era assim em 1957. Estou aí para testemunhar. Bicicleta da época, uma chimbica passando na rua sem calçamento, também o passeio era em terra. Na esquina com a rua Joaquim Modesto estava o Empório Corcovado. Em frente, estavam as casas da Dona Mariinha e do Mário Casqueiro.  Duas ou três vezes por semana, ouvia-se a vizinhança alvoraçada gritando: "O gado, o gado!" e as donas de casa corriam para recolher seus lençóis do varal e para fechar portas e janelas. Era um rebanho de centenas de reses levantando imensa poeira e sendo conduzido por peões, com berrante e tudo, para embarque em vagões ferroviários no final da rua, em frente à chácara Sinhazinha. Em 1959 essa rua foi calçada com paralelepípedos, meus pais mandaram cimentar o passeio em frente da casa e em 2012 as pedras da rua foram cobertas com uma fina camada de asfalto.

Sunday, August 18, 2013

Meus pais: Joaquim Chaves e Aristídia Nunes Chaves no casamento de nosso amigo Valderico Rezende na década de 70, cerimônia ainda presidida pelo Juiz de Paz Odilon.
HAVIA UM TIME DE VÔLEI DO COLÉGIO ESTADUAL
- Araguari Tênis Club, ATC. As escolas de Araguari se reuniam para as disputas intercolegiais. Esta foto mostra o invencível time de vôlei do Colégio Estadual de Araguari, numa partida contra o time do Colégio Sagrado Coração de Jesus, (Colégio das Irmãs), partida cheia de empolgação com torcidas devotadas. Identificamos a partir da direita, de pé: Profe...ssor Heitor, nº 5 Angélica, nº 15 Maria Elizabeth, nº 9 Leila Regina Scalia... na extrema esquerda Professor Antônio Marques. Agachadas: nº 16 Zenith, nº 11 Maria de Lourdes Caixeta(eu) e Wilsonina próxima à bola... Os jogos arrastavam grandes multidões às quadras do ATC e o esporte em Araguari era uma das atividades mais prestigiadas. O professor Antônio Marques sempre dava ênfase e incentivo à prática esportiva. As Olimpíadas estudantis organizadas pela UEA (União dos Estudantes de Araguari) movimentavam a cidade, congregando todos os colégios sob a bandeira Olímpica Estudantil. As modalidades eram: Futebol de Salão, Handball, Basket, Vôlei, ping-pong e Atletismo.
Reza a Lenda que em Araguari...Há a CRUZ DO PADRE no CAMPO REDONDO, que é uma localidade a 23 km de Araguari, pela BR050, em direção à Brasília, entrando à direita no restaurante do Curicaca mais 1.500 metros. Existe essa igrejinha, um cemitério com sepulturas que datam das décadas de 1930 e 40, mas há outras mais antigas, prédio para atividades comunitárias e escolares tudo muito bem conservado.  Há a história sobre um padre convidado a celebrar uma missa em uma fazenda na região do Campo Redondo no século XIX e que ele havia cobrado pela a missa, uma quantia considerada excessiva pelo fazendeiro. O preço foi contestado, mas o padre não fez por menos e partiu com as patacas de cobre em sua mula.  Esse fazendeiro, após as festividades, indignado, enviou um jagunço armado para reaver seus valores. A tocaia se deu no alto do morro, onde hoje plantamos milho e soja, mas milagrosamente o padre não morreu, e assaltado e ferido, rogou uma praga para que aquela família nunca conseguisse prosperar como castigo pelo mal que lhe haviam feito. Ele ficou aleijado. Nossos vizinhos mais antigos contam que a praga foi eficaz e os ricos fazendeiros acabaram na miséria e seus descendentes tiveram a mesma sina. Ainda há um monte de pedras e os resquícios de uma cruz no local, que ainda é preservado, e as pessoas vão até lá rezar, pedir graças e levar flores.  Todos os habitantes locais conhecem o lugar como “A Cruz do Padre”.
O GADO ZEBU.
Reza a Lenda e as informações do Museu do Zebu, da ABCZ (Associação Brasileira dos Criadores de Zebu) em Uberaba e do historiador Hugo Prata, que um ARAGUARINO, no século XIX, foi o primeiro brasileiro a trazer para o Brasil, bovinos da raça Zebu, precursora dos atuais Nelore, Gir, Indubrasil, Guzerá etc. importando-os diretamente da Índia. Os primeiros Zebus, foram importados por D. Pedro I para a Fazenda Real Santa Cruz, em 1826, mas dos excedentes do zoológico de Londres . Manoel Lemgruber importou em 1878 dos excedentes do zoológico da Alemanha, animais esses comprometidos com cruzamentos de origem africana. O único transporte intercontinental era marítimo. Navios a vapor só foram construídos por Robert Fulton em 1807 e no final do século gastavam 21 dias no percurso entre a Europa e o Brasil. Viajar à Índia, contornando a África, sem contratempos meteorológicos, demorava por volta de 47 dias. Havia ainda trechos a percorrer a cavalo, carroças e a pé pela Península de Kathiawar na região de Gir, Província de Guzerat, entre guerras religiosas e étnicas, até o local onde a compra seria feita.  Era preciso coragem para enfrentar o desconhecido e os riscos para se chegar lá.  Araguari fora elevada a cidade em 1888 e quatro anos após a queda da monarquia, em 1893 havia um araguarino chamado Teófilo Godoy que dispunha da coragem e dos recursos necessários para realizar aquela empreitada. Ele foi até lá, adquiriu e trouxe 6 reprodutores e 2 matrizes para criadores em Uberaba, numa viagem de 135 dias. Onze anos depois ele retornou à Índia, em 1904 e após três meses desembarcava em Santos com um lote de 15 Zebus para criação em suas terras em Araguari. Nos anos 1930/40 mais bovinos foram trazidos da Índia para Uberaba, particularmente pelo pecuarista Torres Homem Rodrigues da Cunha, falecido em 2010 e herdeiro da marca VR, entre eles o Karvadi e Taj Mahal, campeões da raça e que geraram outras centenas de reprodutores, preferidos pela rusticidade, adaptabilidade, fertilidade e rápido ganho de peso em carne. Numa das vezes foi necessário trazer o tratador indiano “Dico” que criara os bezerros desde o nascimento e se recusava a se separar deles. Na Índia os bovinos são sagrados. Zebu significa “Berço Sagrado”. O Brasil mantém hoje o maior rebanho comercial de bovinos do mundo, atingindo mais de 212 milhões de animais, maciçamente localizados na região Oeste. Teófilo Godoy: mais um pioneiro para a história da nossa Araguari.
Lendas do Laerte III
Laerte Pintor.
A foto é de 1975, antes de a Dona Aurora se estabelecer à direita. Na verdade naquele quarteirão só havia uma casa antiga, o restante eram muros e terrenos vagos. Do outro lado da rua era a Dona Beiramar. O nosso Brejo Alegre ainda corria a céu aberto e num domingo de sol, era costume por uma bermuda e dar um passeio a pé. Fotografei meus amigos Anderson Mamede e Laerte Pintor(do me...io) e meu irmão Herlon. A piada do dia ficou por conta do Laerte que é exímio violonista, cantor de boleros e sucessos do rádio. Na noite do sábado anterior, fizemos uma galinhada lá na Olegário Maciel e ao som do melodioso violão e sua bela voz, jogamos várias partidas de truco. Só lá pelas 4:30 é que nos demos conta da hora. Todos se foram, meio alegres, com o compromisso de rebater a ressaca no domingo de manhã. Laerte em seu Chevrolet Belair 1956 foi para casa já imaginando uma desculpa para a patroa. Parou o carro distante para não acordá-la, contou ele, abriu a porta e entrou sorrateiramente. De repente a luz se acende e lá estava ela com um despertador West Clock na mão e disse: “São 4:50 Laerte!” e ele respondeu: “Pode comprar que tá barato.”See more
Lendas do Laerte Pintor IV
     Reza a Lenda que, na década de 1970, aconteceu a crise mundial do petróleo. A ordem do General Emílio Garrastazu Médici era economizar combustível. Os postos de gasolina não podiam vender o produto nos finais de semana e era proibido transportar gasolina em galões. 
     Nessa época o Lerte, trabalhava duro em sua oficina de reforma de automóveis e ela estava lotada.   Num sábado à noite, alguns jogavam truco e eu refogava uma galinha na panela de ferro preta. A comida ficou pronta lá pelas 4:00h da madrugada e  às 5:30h da manhã do domingo já tinha acabado e todos iam embora.  Na saída o Laerte se lembrou de que tinha prometido entregar pronta na segunda-feira a viatura da Polícia Militar que estava lá para reformar a lataria e a pintura. 
     De lá de casa ele já foi para a oficina que ficava na Rua Daniel Xavier, esquina com a Padre Lafaiete. Meio dormindo, abriu as portas da oficina e deu início aos trabalhos de funileiro na velha Rádio Patrulha, uma Chevrolet Veraneio.  Martelou, passou massa, lixou e deixou tudo no jeito de pintar. Lá pelo meio dia a fome chegou.
     Fechou as portas da oficina, entrou em seu carro e deu partida. Nada. Olhou no tanque: vazio. A única solução era pegar uns litros de gasolina emprestados para ir almoçar e voltar para terminar a pintura. Reabriu as portas, pegou uma mangueirinha e um galão, foi até a viatura policial, abriu o tanque, introduziu a mangueirinha e fez sucção deixando escorrer a gasolina para dentro do galão que estava no chão.
     Quando já tinha uns três litros no galão, ouviu passos atrás dele. Nem olhou, simplesmente levantou o galão bem acima de sua cabeça, ainda com a mangueira dentro do tanque e a gasolina correndo de volta e disse ao policial que acabava de chegar: “Acabei de consertar o tanque que estava furado. Não tinha gasolina nem pra manobrar, mas já tô pondo um pouquinho.”
     Reza a Lenda que ainda posso ouvir o tilintar das ferraduras dos cavalos contra o calçamento de paralelepípedos da Olegário Maciel. Lembro-me já estar deitado na cama quentinha, já bem tarde da noite, às vezes uma chuvinha fina e duradoura e aquele barulhinho distante que vinha chegando, numa cadência crescente, passava diante de minha casa e continuava em direção à Rua Marciano Santos. 
     Eram as charretes, pequenas carroças com uma cobertura de lona e rodas com pneus, puxadas a cavalo. Tinham, além da capota, uma grande lona para cobrir as pernas dos passageiros em dias de chuva. Na parte traseira tinha uma grade para comportar as malas. Essas charretes sempre se dirigiam de madrugada para a estação ferroviária Goiás.
     Muitas vezes minha mãe, meus dois irmãos e eu fazíamos esse trajeto de charrete. Meu pai combinava na véspera com o charreteiro informando o horário e o percurso. Era uma verdadeira festa mágica para nós crianças.  O cavalo com os tapa-olhos, os arreios, largas tiras de couro branco atavam o cabeçalho da charrete ao peitoral e à cilha, de onde saíam duas correntes que se prendiam à madeira, que era para dar a tração e uma correia larga passando pelas patas traseiras para frear.   Tinha um dispositivo para pisar e subir. 
     Todos a bordo, o charreteiro não chicoteava o cavalo, só batia o cabo do chicote em um suporte, o animal entendia e lá íamos nós, num chacoalhante trote, virando à esquerda na A Nordestina, indo pela Marciano Santos,  passando em frente a Estação Ferroviária Mogiana, um prediozinho modesto, porém bonito,  depois o quiosque do Tojiko e logo estávamos lá, diante dela, a magnífica
Estação Ferroviária Goiás.


Construção solene, imponente e elegante. Como uma grande catedral que torna pequenos aqueles que adentram suas instalações, aquela estação sempre fascinou os araguarinos e quem quer que por ali passasse. Quando foi desativada, caiu um tempo em esquecimento, mas graças a Deus, as autoridades locais deram a ela o destino nobre e honrado que ela sempre mereceu.
Lendas do Laerte V
Reza a Lenda que lá pelos idos de 1968, o Laerte estava solteiro e morando no segundo andar de um prediozinho em frente à Estação da Goiás. Muito trabalhador, ele seguia sua rotina com dedicação.  Ia a um barzinho depois do trabalho, tomava umas geladas, ia para casa às 23:00h, subia as escadas, abria a porta, sentava-se na  cama, tirava a botina do pé esquerdo, “plafe”, jogava no chão, tirava a do pé direito e “plafe” jogava no chão, tomava um banho, deitava cansado  e dormia o sono dos justos.   Numa sexta-feira, a vizinha jeitosa que morava no apartamento abaixo do dele, chamou-o e disse-lhe educadamente que ela estava sendo acordada todas as noites nos últimos três meses pelo som de sapatos batendo no assoalho dele o qual era o teto do quarto dela e que até faziam tremer a lâmpada, disse que já estava cansada de ouvir um barulho, depois o outro e lhe perguntou se ele poderia mudar seu comportamento e parar com aquele “plafe!” daí um pouquinho “plafe!” toda noite.  Envergonhado, ele se desculpou e jurou que nunca mais faria aquilo.  No sábado, o Laerte bebeu cerveja, caipirinha e tocou esse violão "Di Giorgio" aí da foto e cantou,  jogamos truco até as 3:00h, comemos galinhada e às 4:00h lá foi ele para o apartamentozinho.  Estava bem “de fogo”. Subiu as escadas e na rotina de costume: Sentou-se na cama, tirou uma botina, jogou no chão com força “plafe”, tirou a outra e...  ooopa!  lembrou da promessa feita à vizinha.  Parou com a mão no ar, segurando a botina e silenciosamente colocou-a suavemente no chão.  Satisfeito por ter cumprido a palavra, ou metade dela, descansou a cabeça no travesseiro. Quinze minutos depois, acordou com alguém esmurrando a porta. Foi ver e era a vizinha. Descabelada, de olhos vermelhos, tão arregalados e cheios de ódio que ela mal conseguia falar, mas ele ainda conseguiu ouvir ela dizer: “Será que o senhor pode jogar logo a droga do outro pé de sapato. Eu preciso dormir!!!!”
Lendas do Laerte VII
Reza a lenda que
Em janeiro de 1980, num sábado, um vizinho que encontrou uma vaca de nossa propriedade atolada em uma grota na divisa de sua fazenda telefonou para o meu pai em Araguari informando e resolvemos ir lá.    O Laerte sugeriu e transferimos o truco para lá. Fomos em dois carros, na Belina  meu pai, meu irmão, meu tio Rui e eu. Outros três no velho Dodge Dart do Laerte.     A mulher do peão começou a fazer a galinhada.  A mesa de truco já estava armada e a cervejas na geladeira esperando.  A ideia era tirar a vaca e trazê-la para o curral, reidratá-la e começar a jogar.  Já eram umas 17:30h e descemos lá para a grota. Uns 8 homens.  A rês estava afundada na lama até o pescoço. Dois entraram para cavar em volta, colocar o laço e os outros fazendo força puxando para fora do atoleiro. Depois de uma meia hora, todo mundo sujo, conseguimos tirá-la de lá.  Meu pai, se afastou, ficando a uns 30 metros, pois sabia que ela ia investir quando estivesse livre. Os outros em volta fazendo força para ela levantar. De repente ela se levantou e partiu com tudo, no rumo do meu pai.  Atrás dele tinha uma grota profunda. A vaca chegou até ele e com uma cabeçada o atirou dentro da grota.  Ao cair ele quebrou a perna esquerda com fratura exposta.   Meu irmão correu em casa trouxe um coxão de molas e desceram a grota para resgatar o Sr. Joaquim Chaves. Colocaram-no sobre o coxão e subiram de volta. Quando descansaram o coxão no chão, ele foi posto sobre uma caixa de marimbondos.  Foi um alvoroço. Era gente dando tapas nas orelhas, na nuca, nos braços, correndo para os lados e deixaram meu pai lá. Ele não foi picado nenhuma vez. Os mais corajosos voltaram lá e o resgataram. Andaram até a cerca de arame farpado e colocaram o coxão no chão. Sobre outra caixa de marimbondos. Aí sobrou pra todo mundo. A cabeça do Laerte parecia uma moranga de tão inchada.  Buscaram alicates, cortaram o arame e colocamos meu pai no carro e voltamos para a cidade. No hospital, o médico presente examinou, ponderou e disse que pela idade avançada e a gravidade da fratura não tinha solução. Teria que amputar a perna. Foi um clima dos piores. Tudo mundo de cara inchada, parecendo japonês e ainda aquela notícia. Buscamos a ajuda do Dr.Luiz Cláudio Sardela.  Ao examinar, ele disse: “deixa comigo que eu resolvo essa questão.”  Levou meu pai para a sala de cirurgia e praticamente montou o quebra-cabeças com ossos estilhaçados, parafusando-os a uma barra de platina com numerosos parafusos. Devemos a ele a dedicação e o empenho com que tratou de meu pai, que depois de uns seis meses voltou a andar normalmente.  Dr. Luiz Cláudio Sardela, pessoa competentíssima e valorosa.  Quem mais tomou ferroadas dos marimbondos foi o Laerte. No dia seguinte ele foi ao hospital visitar meu pai e disse: “Quase que não entro em casa ontem. Minha mulher não me reconheceu.”
LENDAS DO LAERTE VIII
Reza a Lenda que estávamos nos últimos dias de férias do Estadual em 27 de julho de 1968, num sábado  com um vento frio cortante em Araguari.  Fogão de lenha aceso, uns em volta da mesa de truco outros buscando o calor do fogo.  O jogo tinha começado cedo e precisava acabar cedo, pois todos nós íamos ao Bar Capri, em frente à praça Getúlio Vargas assistir a eliminatória do Festival Estudantil de Música Popular. A finalíssima era entre o Laerte e o Gomera. Valia taça e prêmio em dinheiro.   O Laerte tinha brigado com a namorada e estava sorumbático.  Comemos a galinhada e fomos apoiá-lo com nossos aplausos. Uma turma de uns dez, descendo pela Marciano santos até a praça naquele frio antártico. Todo mundo encapotado,  o bar todo enfeitado e apinhado de gente. O Nocera já estava a postos com seu conjunto.  Anunciaram o Gomera e ele deu um show com “Love is all”, memorável.  Quando o Laerte, de roupa nova, ia para o palco, encontrou a namorada emburrada e para reconquistá-la disse-lhe que iria cantar uma música especialmente para ela.  Anunciaram a música “Ronda” que eles tinham ensaiado.  O Laerte disse: “Não.  Eu quero cantar é ‘Eu sei que vou te amar’ do Vinícius de Morais”. O apresentador coçou a cabeça, olhou para o Nocera e perguntou se podia trocar de música e ele concordou. O Laerte soltou a voz, cantou como um sabiá apaixonado.  Tinha gente que chorava.  O povo aplaudiu de pé. Na votação do júri deu empate. Nos aplausos também deu empate. Resolveram dividir o prêmio. Metade do dinheiro e uma taça para cada um. O Laerte comemorando, levantava a taça e mostrava ao público que aplaudia e ria muito ao mesmo tempo. Então ele acenava mais ainda e fazia pose para as fotos e mais o pessoal dava risada. A namorada agora sorridente, toda emocionada, exibindo a taça.  O dinheiro bebemos em cervejas, depois  fomos embora. No próximo sábado, o Laerte cabisbaixo chegou lá em casa um envelope com as fotos reveladas e disse: ”Agora vi porque todo mundo estava rindo.”  As fotos muito nítidas o apresentavam com a taça na mão, camisa preta, calça preta e a braguilha aberta com a cueca samba-canção branca dando tchauzinho para fora da calça.
LENDAS DO LAERTE IX

Reza a lenda que mesmo depois de tantos anos, nos anos 80, nossos usos e costumes continuavam com a pontualidade de sempre: truco, galinhada, cerveja gelada e caipirinha. Era minha vez na cozinha. Aquele sábado foi o recorde de azar do Laerte. O sanhaço dele, idêntico a esse aí da foto, que cantava maravilhosamente e se chamava Violino, morreu. Ele e o parceiro dele perderam todas as quedas que jogaram das 19:00h até às 4:00h da madrugada do domingo e por isso desafiaram para revanche no domingo à noite. Perderam de novo. Aborrecido, o Laerte reforçou na caipirinha e saiu lá de casa bem temperado, mais precisamente “cercando frango no corredor”. Acordou numa ressaca bíblica. Foi trabalhar assim mesmo. E nesse estado de espírito ele recebeu em sua oficina um antigo amigo às 09:00h da manhã daquela segunda-feira, que pedia que ele fosse testemunha em uma audiência no fórum de Araguari às 14:00h daquele dia. Era um velho amigo, cujo filho já havia causado ao Laerte transtornos e muita raiva. Os nomes serão omitidos a título de preservação, mas o fato é verídico e de domínio público. Por considerar muito o amigo, o Laerte aceitou o pedido. Ele nem sabia do que se tratava e o amigo nada lhe disse. Trabalhou até 12:30h, já estava atrasado, atravessou a rua e foi lá pra casa. Pediu para tomar banho, almoçou, vestiu sua célebre camisa preta e o meu irmão, Herlon, o levou ao fórum. Chegaram em cima da hora. A Juíza, circunspecta, solene e carrancuda, ajeitou os óculos na ponta do nariz e perguntou ao Laerte:
-“O senhor conhece o acusado Álvaro?” o Laerte olhando para seu amigo disse:
-“Claro que sim, minha senhora, é uma pessoa muito boa, trabalhador, dedicado, paga em dia e é um bom pai de família. Conheço ele há mais de 30 anos e posso dizer que é uma ótima pessoa. Tudo que sei dele são coisas boas. Pode confiar.” A Juíza muito séria olhou no fundo dos olhos do Laerte e disse:
- ”Senhor Laerte, ele nem é casado e tem menos de 30 anos. O senhor sabe que pode sair daqui algemado e preso por falso testemunho?”
- “Aúúúú! A senhora está falando de quem? Desse meu amigo aqui, o Álvaro?” Perguntou o Laerte, admirado e surpreso, indicando o velho amigo dele que já balançava a cabeça desesperado.
A meritíssima cerrando os dentes esbravejou: -“O senhor se dirija a mim com respeito!!! Eu estou falando do réu que está sentado a sua direita e que tem o mesmo nome do pai dele.”
-“Ahhhhh, bom! agora a senhora me deixou mais tranquilo. Tô fora!” disse o Laerte tremendo e aliviado, completou: “Desse aí não sei é nada de bom”.